quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

16. MAIL



Meu caro senhor:

Acabo de ler o mail que o senhor enviou ao Silveira - o Silveira e eu somos velhos amigos, mas ele sofre de perturbações mentais, tem delírios, faz despesas que se esquece de pagar, e por aí fora, portanto não é surpreendente que eu fosse autorizado (mas autorizado a sério, com assinatura reconhecida pelo notário) a controlar-lhe a correspondência.

Sou o Padre João de Jesus.
Pelo que percebi do seu mail, o Silveira tem andado a contar-lhe histórias muito sinistras. Coitado. É bom moço, mas a cabeça é que não bate certo. Ele é amigo do Davoud, mas de vez em quando mete-se-lhe na caixa dos pirolitos que o Davoud é um assassino. Pelo visto, eu também seria parte na comandita. Parte!? Segundo a história, seria até o cérebro. Meu caro amigo. Não acredite em patranhas do Silveira. Veja mas é se ele não lhe fica a dever dinheiro. Os seus lapsos são já muito conhecidos no bairro.

Quero aproveitar para lhe dizer que o Davoud também não é quem o senhor pensa. Aqui há tempo, numa conversa muito estranha e cheia de trapalhadas, o Silveira afiançava-me que o senhor lhe tinha dito que o Davoud seria o filho de um amigo seu que emigrara para Paris. Impossível. Pensei que o senhor também fosse maluquinho, porque na história do Silveira (sua, portanto) entravam já extra-terrestres e parece que uma senhora de cabelos molhados. Quando li agora o seu mail é que as coisas começaram a encaixar. Mas fazendo pouco sentido! Só me saem duques, com perdão da expressão pouco cristã...

Gostava de lhe falar a bem, porque os meus caminhos são os que me indica o Altíssimo, e outros não tenho. Faço o Bem sem olhar a quem! Mas gostava de lhe pedir que não se pusesse com investigações nem manias, porque, entenda, o Silveira sofre de delírios, tem ataques, e o Davoud, por outro lado, também tem um feitio... complicado!

Não há velha nem velhinha nem velhona. Ninguém assassinou ninguém!

Meta-se na sua vida.

Passar bem.

Seu,

Padre João de Jesus

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